Biscoito #2: Don't Tell. Baby. Show!
- Ana Amélia

- 30 de nov.
- 5 min de leitura
Olá, alma escritora!
Bem-vinda, bem-vindo à nossa nova oficina: a série Biscoitos. Sabe aquele seu texto que já tem uma boa massa — a história está lá, os personagens são interessantes, a gramática está no ponto —, mas você sente que falta aquele algo mais? Aquele toque que transforma o bom em memorável? É como ter uma fornada de biscoitos amanteigados, deliciosos, mas que poderiam se tornar inesquecíveis com uma pitada de canela, um toque de gengibre ou raspas de limão.
Nesta série, não vamos "corrigir" nada. Vamos "temperar". Vamos pegar um rascunho já competente e, juntos, explorar como potencializá-lo, como encontrar o sabor exato que a sua intenção de autor deseja. Hoje, nosso tempero especial é uma das especiarias mais poderosas da despensa de um escritor: a técnica do "Mostrar, não contar".
Vamos ao nosso forno?
1. Apresentação do Desafio: "Mostrar, Não Contar"
O desafio de hoje é um clássico. Temos uma cena com uma carga emocional forte: um personagem, Jonas, acaba de receber a notícia da demissão por telefone. O texto original é claro, direto e funcional. Ele conta ao leitor exatamente o que Jonas está sentindo. Mas... será que poderíamos fazer o leitor sentir junto com ele?
O objetivo da nossa receita de hoje será traduzir a informação ("tristeza", "raiva") em experiência sensorial e comportamental, usando a técnica "mostrar, não contar" para mergulhar o leitor na cena.
2. O Manuscrito Competente
Aqui está o nosso "biscoito" antes de ir ao forno. Note que não há nada de "errado" com ele. A cena é perfeitamente compreensível e cumpre sua função narrativa.
Jonas desligou o telefone. A voz do seu chefe ainda ecoava em sua mente. Ele não podia acreditar que estava demitido depois de tantos anos. Uma onda de tristeza e raiva o invadiu. Ele se sentiu perdido, sem saber o que fazer a seguir. Olhou ao redor do seu escritório em casa, para os livros e os papéis que representavam sua carreira, e sentiu um vazio profundo. O futuro parecia incerto e assustador.
Funcional, certo? Nós entendemos a situação. Mas estamos com Jonas ou apenas o observamos de longe, através de um vidro?
3. O Diálogo Exploratório

Agora começa a nossa conversa, o coração do trabalho editorial. Em vez de dizer "faça isso ou aquilo", vamos explorar o potencial da cena com perguntas. Imagine que eu estou ao seu lado, lendo seu rascunho, e pergunto com genuína curiosidade:
A Ação Física da Notícia: Como o corpo de Jonas reage fisicamente à notícia? A mão que segura o telefone treme? Ele o aperta até os nós dos dedos ficarem brancos? Ou o telefone simplesmente escorrega de sua mão e cai no tapete, produzindo um baque surdo? O ato de "desligar" foi um toque suave ou uma batida violenta?
O Ambiente Sensorial: O que mais existe na sala além de "livros e papéis"? Há um raio de sol entrando pela janela e pousando sobre a poeira que dança no ar? Ouve-se o barulho do trânsito lá fora, indiferente ao seu mundo que acaba de ruir? Qual é o cheiro do ambiente? Café velho? Papel antigo? A temperatura da sala muda para ele, ou é ele quem sente um calafrio repentino?
O Foco do Olhar: Você diz que ele "olhou ao redor". Mas para onde o olhar dele é puxado primeiro? É para o porta-retrato com a foto da família, que agora representa o peso de uma nova responsabilidade? É para o diploma na parede, que de repente parece inútil? É para a janela, buscando um ar que lhe falta nos pulmões? O que um objeto específico nos diz sobre seu estado mental?
A Tradução do Sentimento: "Tristeza e raiva" são os rótulos. Como essas emoções se manifestam? Raiva é um punho cerrado que bate na mesa? É uma vontade de gritar contida na mandíbula travada? Tristeza é o peso nos ombros que o faz curvar? É o ardor nos olhos antes das lágrimas que não vêm? O "vazio profundo" tem um som? É um zumbido no ouvido?
É nesse mergulho investigativo que reside a mágica. Ao responder a essas perguntas, o autor não está apenas "melhorando o texto", está aprofundando a sua própria compreensão do personagem e da cena. É aqui que a nossa filosofia na Letra & Ato se materializa: a revisão não é apenas um serviço de correção, mas um diálogo que busca alinhar cada palavra à intenção do autor, potencializando a voz que já existe.
4. A Sugestão de Modelagem
Depois da nossa conversa, uma das inúmeras possibilidades de reescrita poderia ser esta. Observe como as respostas às nossas perguntas se transformaram em ações, sensações e detalhes concretos. Não estamos mais contando sobre a tristeza e a raiva; estamos mostrando a sua anatomia.
O telefone bateu com força no gancho, um estalo plástico que foi o único som a quebrar o silêncio do escritório. A mão de Jonas permaneceu sobre o aparelho, os nós dos dedos brancos, a aliança de casamento pressionando a pele. Ele empurrou a cadeira para trás e andou até a janela. Lá embaixo, a vida continuava: carros passavam, uma ambulância gritava à distância. Ele levou a mão ao peito, sentindo o tecido da camisa e a súbita falta de ar, como se o oxigênio da sala tivesse sido roubado. Seu olhar varreu a estante, parando não nos livros de direito que definiram sua carreira, mas no pequeno boneco de super-herói que seu filho lhe dera de presente. Ele o pegou, o plástico frio e liso na palma da mão. O futuro não era mais uma estrada; era uma incógnita.
Sentiu a diferença? O "biscoito" agora tem textura, aroma, uma complexidade de sabores. Não há um narrador nos explicando o sentimento de Jonas. Há apenas Jonas, suas ações e o ambiente reagindo com ele, e nós, leitores, estamos ali, dentro da cena, sentindo o peso daquele boneco empoeirado em nossas próprias mãos.
Minha Receita Secreta: "Mostrar, Não Contar"

Para assar seus próprios "biscoitos", faça a si mesmo estas perguntas-chave ao revisar uma cena emocionalmente carregada:
Verbos de Ação: Qual verbo específico pode substituir meu sentimento abstrato? (Em vez de "ele ficou com raiva", "ele socou a parede").
Os Cinco Sentidos: O que meu personagem está vendo, ouvindo, cheirando, tocando e provando neste exato momento?
Linguagem Corporal: Como o corpo dele reage involuntariamente à emoção? (Postura, gestos, respiração, tiques).
Interação com Objetos: Como o personagem usa ou percebe os objetos ao seu redor para expressar seu estado interior?
Dica de Leitura
📚Flores para Algernon de Daniel Keyes
Este livro é uma aula magna sobre "mostrar, não contar". A genialidade de Keyes está em não nos dizer que o protagonista, Charlie, está se tornando mais ou menos inteligente. Em vez disso, ele nos mostra essa transformação através da própria linguagem dos relatórios de Charlie, que evolui de uma escrita infantil e cheia de erros para uma prosa complexa e sofisticada, e depois regride. Nós não lemos sobre a mudança; nós a testemunhamos em tempo real na própria estrutura do texto. Uma leitura obrigatória para quem quer dominar a arte de expressar mudanças internas de forma poderosa.
Um café e uma conversa?
Percebe como um texto já bom pode ganhar novas camadas de profundidade? Muitas vezes, o que sua história precisa não é de uma correção, mas de um olhar parceiro, de alguém que faça as perguntas certas para destravar o potencial que já está ali, latente em suas palavras. É um diálogo que busca a essência da sua voz.
Se você tem um trecho do seu original e sente que ele pode ser mais, que tal experimentarmos essa conversa? Oferecemos uma amostra gratuita da nossa revisão. É uma oportunidade para você ver, na prática, como podemos temperar e potencializar o seu texto, juntos. Seu original não é um problema a ser resolvido. É um mundo a ser explorado. Vamos explorá-lo?
Uma boa revisão não aponta o erro; ela ilumina o caminho para a potência do acerto.
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